Os renomados chefs Jefferson Rueda e Janaína Torres personificam a Casa do Porco, um ícone global da alta gastronomia. Em seus discursos, enaltecem a criação artesanal de porcos, pomares orgânicos, adubos naturais do galinheiro e polinização por abelhas africanas, todos elementos que ressaltam um compromisso com práticas agrícolas sustentáveis.
Recentemente, o restaurante foi agraciado com a estrela verde do Guia Michelin, reconhecimento voltado à gastronomia eco-responsável desde 2020.
O que não se destaca nos comunicados da Casa do Porco é a associação com Júlio César de Toledo Piza Neto, um sócio-administrador que tem laços com grandes players do agronegócio envolvidos em controvérsias trabalhistas e disputas por terras indígenas.
Piza Neto, engenheiro agrícola com vasta experiência executiva em empresas de perfil controverso, até recentemente integrava o conselho da Terra Santa Propriedades Agrícolas, uma imobiliária rural com vastas extensões em Mato Grosso, algumas delas arrendadas à gigante SLC Agrícola, líder em commodities agrícolas no Brasil.
Parte dessas terras se sobrepõe à Terra Indígena Batelão, território dos Kawaiwete (ou Kaiabi), cujo processo de demarcação aguarda finalização desde a década de 1980, apesar de decisões judiciais favoráveis aos indígenas desde 2016.
A Terra Santa não respondeu aos questionamentos da reportagem. Listada na B3, a empresa viu Piza Neto renunciar ao conselho recentemente.
Em nota, a Casa do Porco assegurou que Piza Neto, embora seja sócio de Rueda e Torres, não interfere na gestão do restaurante desde sua inauguração em 2015. “Jefferson e Janaína sempre foram os decisores criativos e administrativos da casa”, afirmou a nota, que também destacou associações em outros empreendimentos como o Bar da Dona Onça e a Sorveteria do Centro.
Vínculos Familiares
O envolvimento de Piza Neto com os outros sócios da Casa do Porco remonta ao seu pai, Júlio César de Toledo Piza Filho, pecuarista, cafeicultor e ex-presidente da antiga Bolsa de Valores de São Paulo, falecido em 2020. Investidor do Bar da Dona Onça, Piza Filho foi descrito como um “mecenas” da Casa, financiando o empreendimento desde sua abertura em 2008.
Nas festas, Piza Filho era figura marcante, trajando impecavelmente enquanto recebia convidados e amigos.
Piza Neto, por sua vez, adota um perfil mais reservado. Pouco dado a entrevistas ou aparições públicas, sua presença se destaca nos bastidores das grandes corporações em que está envolvido. Além de suas funções na Kepler Weber, líder em silos agrícolas, e na Hidrovias do Brasil, sua gestão tem sido questionada por comunidades locais por práticas de gestão que, segundo relatos, desconsideram impactos socioambientais.
Controvérsias e Desafios
Enquanto Piza Neto ascende no agronegócio, os discursos sustentáveis dos chefs da Casa do Porco enfatizam a rastreabilidade dos ingredientes e menus sazonais, promovendo uma economia regenerativa e ética.
A concessão da estrela verde a um restaurante cujos sócios mantêm laços com empresas sob críticas trabalhistas e ambientais levanta questões sobre os critérios do Guia Michelin, que até o momento não se pronunciou sobre o assunto.